sexta-feira, fevereiro 11, 2005

Conto novo: Serra do Cachimbo, 1986

Estou produzindo bastante, meus caros, e creio que o livro será finalizado antes do desfecho deste curto mês de fevereiro. Para guardar o ineditismo destes escritos, publico mais uma vez uma curta passagem desta história.


Serra do Cachimbro, 1986

I

Vinte homens, cada um com mais ou menos dois metros de altura, cruzam em quatro canoas motorizadas o igarapé anahutentê, localizado na Serra do Cachimbo, no sul do Pará, nas entranhas da floresta amazônica. Na primeira canoa, de pé, um magrão com as mãos na cintura divisa as margens do pequeno rio. Seus olhos, olhos estreitos mas perspicazes procuram o ponto de desembarque sinalizado por uma grande carcaça de árvore caída, atravessada no igarapé havia sete anos. O homem tira do bolso um pequeno rádio transmissor, fala palavras ininteligíveis enquanto livra-se de uma nuvem de mosquitos raivosos. No segundo barco, um outro magrão alto responde pelo rádio com os olhos voltados para um mapa e uma bússola. Os motores são desligados, as canoas se aproximam de uma margem escondida, a velha árvore é encontrada, todos desembarcam levando sacolas, mochilas, estranhas máquinas e penetram numa velha trilha, muito estreita, quase imperceptível. Duas horas de caminhada e os olhos de todos parecem estalados, bem maiores que o normal. Atentos para o barulho da selva tropical eles mal trocam palavras, todos parecem com medo ou tencionados. O líder ordena que todos parem por cinco minutos, bebam água, se alimentem, cuidem de seus pés molhados e apertados pelo coturno. Os homens fumam, dois ou três tomam um gole d'agua e é só. De repente, quando já se preparavam para proseguir a jornada, um grande barulho, um barulho igual ao de uma televisão fora do ar estoura em seus ouvidos. Eles buscam a origem do som, não vêem, o retundo cresce, a floresta é escura, o barulho despenca sobre eles, a chuva desaba violentamente provocando uma rápida agitação.

Continua...